A 22 de Julho de 2011, a Noruega e todo o Mundo ficaram em estado de choque: um só homem, de 33 anos, assassinou bárbara e friamente 77 pessoas. Nos dias que se seguiram à tragédia, muito se soube sobre os pormenores horrendos dos crimes, sobre os seus fundamentos xenófobos e sobre a premeditação e o método utilizados pelo assassino.
A 24 de Agosto de 2012, decorrido pouco mais de um ano sobre o massacre, Andreas Breivik – o autor confesso dos atentados de Oslo e da Ilha de Utoya – conheceu a sua sentença, decidida por unanimidade pelos juízes que compuseram o Tribunal: passará os próximos 21 anos numa prisão de alta segurança, nos arredores de Oslo, e a pena poderá ser prorrogada indefinidamente se o assassino não abandonar as suas convicções xenófobas e for tido como socialmente perigoso.
Breivik foi considerado pelo Tribunal como “mentalmente são” e, por isso, imputável – essa era a grande questão a decidir, já que a autoria dos ataques sempre foi assumida. Considerado imputável, o extremista xenófobo foi condenado à pena máxima legalmente permitida pelo ordenamento jurídico norueguês; se tivesse sido considerado inimputável (um relatório psiquiátrico, elaborado no início do processo, considerou-o paranóico esquizofrénico), seria internado num hospital psiquiátrico para o resto da sua vida.
Apesar de uma declaração de inimputabilidade poder ter como consequência uma sanção de duração perpétua e, provavelmente, determinar o “esquecimento” da opinião pública relativamente a Breivik, uma sondagem recente, realizada pelo jornal Verdens Gang revela que cerca de 2/3 da população norueguesa pretendia ver o homem que abalou indelevelmente o seu país ser declarado “mentalmente são”, mesmo que isso lhe permita dar entrevistas e publicar livros, mantendo viva a memória de todo um povo.
Este sentimento, de justiça acima da vingança, revela muito sobre a nobreza do povo norueguês. Afinal, estamos perante um acto absolutamente abominável: na Ilha de Utoya, e em pouco mais de uma hora, o assassino disparou (segundo o que ficou provado) 121 tiros de pistola e 136 tiros de uma arma semi-automática, que ia recarregando em frente às suas vítimas, que esperavam sentadas para serem mortas. O desejo de castigo e sofrimento eterno para tão cruel algoz seria perfeitamente compreensível em todos quantos, até hoje, ainda não conseguiram perceber como teve este homem a coragem de praticar tal atrocidade. Mas este caso, a forma como o processo se desenrolou e o seu resultado, demonstram muito mais que isso.
Na verdade, demonstram antes de mais que os noruegueses acreditam na sua justiça. Assistiram à leitura da sentença cerca de 40 sobreviventes e familiares das vítimas, que ouviram, em silêncio, a pena aplicada a Breivik – nenhum suspiro, nenhum soluço; nenhuma exultação, nenhum lamento. Apenas um profundo respeito pelo Tribunal e uma aceitação sem reservas quanto à decisão dos juízes.
imagem daqui. |
Não se trata de morbidez, mas de humanização das vítimas. É importante – é fundamental – que ninguém se esqueça de quem eram nem do que sofreram. Para que os que ficam possam seguir em frente, com a sua confiança no sistema jurídico reparada e com a certeza de que a ordem jurídica é inquebrantável, apesar de todas as violações que tenham lugar.
Uma das sobreviventes do massacre de Utoya, Emma Martinovic, teve o seguinte comentário ao conhecimento da sentença: “Agora, a vida pode verdadeiramente recomeçar.” A paz de espírito inerente a esta afirmação diz tudo. Que assim seja.
Publicado hoje, no Público.
Publicado hoje, no Público.
2 comentários:
o seu post arrepia
ainda bem
Obrigada, Helena.
Seja muito bem-vinda a este recanto.
Enviar um comentário