segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Liberdade, igualdade e fraterni… quê?


A história percebe-se melhor se contada na com uma pessoa: Cristina Dimitru passou 18 meses (entre 2005 e 2007) numa caravana em Nantes, sem água nem electricidade, sem acesso à escola ou ao mercado de trabalho, impedida de pedir um visto de trabalho. Persistente, lutou durante esse tempo contra um sistema pouco permeável a conceder uma oportunidade de vida. Em 2007, entrou directamente para o quarto ano de escolaridade, em Junho de 2011 obteve o certificado de aptidão pedagógica. Em Dezembro do mesmo ano, o Governo francês condecorou esta jovem de origem Romani com o título de melhor aluna de França. Em 2010, uma outra aluna com as mesmas raízes étnicas recebeu idêntico galardão.

Dois casos com um final feliz que, vistos isoladamente, dariam a ideia de que a terra dos sonhos existe, afinal, e é em França. Mas se alargarmos um pouco mais o “zoom”, vemos uma realidade bem distinta. Em Outubro de 2010, o Governo de Sarkozy expulsou inúmeras famílias ciganas, a troco de 300 euros, com o argumento de que estavam ilegais. Uma violação do Direito Comunitário, que proíbe perseguições baseadas em motivos religiosos ou étnicos. Nicolas Sarkozy foi duramente atacado pela comunidade internacional e perdeu a “guerra”. Então, a Comissária Europeia para a Justiça, Direitos Fundamentais e Cidadania, Viviane Reding, intimidou a França com punições e declarou: “Eu pensei que a Europa não seria mais testemunha deste tipo de situação depois da Segunda Guerra Mundial.”

imagem vista aqui.

Em Março deste ano, em plena campanha presidencial, François Hollande comprometeu-se a encontrar “soluções de realojamento” para os Roms: “Não podemos continuar a aceitar que famílias sejam perseguidas de um lugar e não haja solução.”

O certo é que uma circular interministerial emitida recentemente determina a aplicação “imediata” do fim das “ocupações ilícitas de terrenos”, ordenando aos governantes locais que “recorram à força pública” se necessário. A circular impõe, apesar disso, que seja assegurado “tratamento igual e digno a todas as pessoas em situação de perigo social”, através de medidas que promovam a inserção dessas mesmas pessoas (escolarização, saúde, emprego, abrigo).

A eleição de Hollande para o cargo de Presidente da República de França, em Maio último, fez com que boa parte da Europa suspirasse de alívio, por muitas razões. Sarkozy teve, na opinião dos franceses, demasiados desatinos políticos para que fosse reeleito e os “novos ventos” do socialismo voltaram ao poder na velha Gália. Mas se Hollande prometeu bater o pé às vontades da senhora Merkel, no que à economia diz respeito, mantém a intransigência de Sarkozi contra os Roms (ciganos). No último mês, foram já três os campos de Roms evacuados à força: Lille, Lyon e, agora, Ile-de-France à Evry, nos arredores de Paris, com a expulsão de cerca de 80 pessoas.



Hollande até pode estar a ser menos agressivo do que Sarkozy no tom e nos modos utilizados para desmantelar os acampamentos. Mas não deixa de continuar a violar o Direito Comunitário, de continuar a perseguir uma comunidade e, acima de tudo, de persistir no erro de tentar resolver a questão de forma populista. A História ensina que não é por serem atirados “borda fora” de um país que os povos deixam de procurar uma vida melhor, deixam de buscar a “sua” terra de sonho. Liberdade? Igualdade? Fraterni… quê? Pois. Era isso, era.

A minha crónica, publicada ontem no Público.


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